sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

FILME 4: tópicos de debate para "Sacríficio", A. Tarkovski

Alguns fragmentos sobre O Sacríficio
Andrei Tarkovski
apresentado por Rodrigo Silva


1. É o último filme de Tarkovski, talvez o seu testamento espiritual. Foi realizado em condições extremamente difíceis e nos últimos meses de vida de Tarkovski, já muito fragilizado pela doença. O filme recapitula os grandes temas da sua obra: a desorientação espiritual do homem face à invasão do materialismo e do individualismo no mundo moderno, a consciência trágica da solidão humana, a angústia com a perda do absoluto, o desenraizamento, o exílio, a perda, a guerra. Ele di-lo explicitamente numa das últimas entrevistas : « Nous ne voulons pas nous avouer, écrivait-il à cette époque, que nombre des malheurs qui frappent l’humanité proviennent de ce que nous sommes devenus impardonnablement et désespérément matérialistes ».

2. O filme é uma parábola sobre o sacrifício e sobre o gesto/decisão de entregar-se a uma razão superior e desconhecida, de entregar a sua vida como forma de regeneração/renascimento espiritual ou como dar a vida pelos outros (o sacrifício tem como modelo a ideia de cristã do dom de si, mas o tema sacrificial é núcleo original de quase todas as religiões – longa discussão que não posso encetar aqui, sobretudo porque tenho enormes “reservas” sobre a questão do sacrificial, na religião, na política, no amor na arte). Todos os filmes de Tarkovski são de algum modo parábolas sobre a liberdade e sobre o preço que é preciso pagar para ser verdadeiramente livre (Alexandre experimenta essa liberdade de uma forma paradoxal: como abdicação e obediência). Para Tarkovski é porque o homem perdeu o espírito de sacrifício que se tornou presa do materialismo mais feroz, impotente para resistir aos mecanismos destruidores da sociedade individualista e às forças de dissolução que a atravessam. O fascínio do consumo e da vida material, a imbecilização organizada pelo entretenimento, a infantilização consentida, a ausência de autenticidade nos laços humanos, a desumanização organizada que conduz o homem ao desespero e à ausência de sentido que o devoram - sinais de um empobrecimento espiritual, do qual os homens são responsáveis individual e colectivamente. Esmagado sob o peso do materialismo, esvaziado da sua substância, incapaz de olhar o vazio que se abre diante de si, segundo a convicção de Tarkovski, ele está diante de uma escolha: ou obstinar-se na via da alienação, suportando-a com cinismo ou com progressiva angústia, ou reapropria-se de si mesmo e do seu destino e reconhece em si a sua destinação transcendente, retomando a busca espiritual que o pode fazer sair da crise profunda que atravessa e que o encerra nas rotinas de um quotidiano sem saída.

3. O sacrifício repousa sobre uma escolha insensata, irracional, incompreensível, um salto no obscuro, um acto de fé. É uma aposta mortal e mortífera, onde tudo se pode perder, mas que pode ser um gesto de libertação. Esse acto é a decisão absoluta, uma acto absurdo feito na maior solidão e no extremo do desespero: "le fait que Dieu écrit-il ait entendu la requête d'Alexandre a des conséquences à la fois terribles et exaltantes. On peut trouver terrible, en effet, qu'Alexandre, fidèle à son serment, rompe de façon pratique et définitive avec le monde et les lois auxquelles il s'était plié toute sa vie. Il perd ce faisant, non seulement sa famille, mais aussi toute sa capacité d'évaluation des normes morales, et c'est bien cela qui apparaît comme le plus terrible aux yeux de son entourage. Malgré cela, ou plus précisément à cause de cela, Alexandre incarne pour moi l'élu de Dieu". Quem nele penetra, "se met à penser, à sentir, à désirer différemment des autres. Tout ce qui est cher aux hommes, tout ce à quoi ils tiennent, lui devient inutile et complètement étranger...Les vaisseaux sont brûlés, la voie de retour est interdite, il faut aller de l'avant vers un avenir inconnu et toujours terrible...Sur son visage où se reflète douloureusement son inquiétude, dans ses yeux qui brillent d'une lumière étrange, les hommes veulent discerner les signes de la démence, afin d'obtenir le droit de renoncer à lui. Il détruit son foyer, se sépare de son fils, qu'il aime pourtant au-delà de tout, et il s'enfonce dans le silence...". A atitude do que se sacrifica rompe com os encadeamentos da lógica normal, é desmesurado, é uma hybris que escapa a qualquer medida, "contredit la conception matérialiste du monde et les lois qui l'accompagnent. Il apparaît comme absurde ou maladroit. Malgré cela (ou peut-être à cause de cela), la démarche d'un tel individu transforme profondément l'histoire et le destin des hommes". O sacrifício propõe perder para ganhar, dar a vida a uma morte em nome de uma outra vida – ou para preservar os outros e salvar o mundo : o scrificio, “ne reste pas confiné à sa source mais se répand sur le monde entier en cercles sans cesse élargis” (P.Claudel). Para Tarkovski, a fé um risco, uma aventura, não traz vínculo a uma comunidade ou participação em ritos: não é uma segurança, é um compromisso solitário.

4. Todo o filme mostra como o sacrifício confina com a loucura, tal como os sábios e os loucos estão muito próximos. A lógica do sonho invadiu o real, as fronteiras entre ambos dançam e quebram-se as velhas hierarquias. Nada do que poderia ser esperado acontece e tudo o que acontece é inesperado. Muito do que as personagens fazem, dizem ou descobrem não é verosímil como se a narrativa fosse amnésica e tivesse elipses temporais. É um filme onde a lógica da ambivalência é levada ao limite mais nas personagens do que nas digressões metafísicas (de Otto) que ligam a história individual à colectiva. O filme articula o individual e o colectivo e mostra como os destinos estão fatalmente entrelaçados, numa estranha aliança entre as histórias singulares e o destino de todos.

5. Há a questão perturbante da proximidade da religião com o pensamento mágico, panteísta, (ou com o milagre, o supersticioso ou o paranormal). Há uma sobreposição do cristianismo com o pensamento mágico, um fundo de feitiçaria pagã (Alexandre reza a Deus e dorme com uma bruxa, como se fosse uma divindade que tem de pacificar para afastar o mal). Nunca sabemos o que fez passar o cataclismo que se tinha iniciado ou anunciado, foi algo do divino ou das forças obscuras e nocturnas que fascinam (ou mesmo o acaso).

6. O cinema é uma arte que nos mostra que a paternidade simbólica - a transmissão da lei - se tornou impossível de exercer. A palavra do pai já não conta só o seu silêncio o manifesta: o cinema é testemunha deste pacto entre o acto, a palavra e o silêncio. Alexandre é pai apagando um acto no mundo e remetendo-se ao silêncio e à loucura mas deixando restaurar o recomeço, a possibilidade de um arkhè, na criança, no filho que começa a falar no fim dizendo: no princípio era o verbo.

7. Tarkovski é um cineasta das sensações, “hiperestésico”: a exacerbação da sensibilidade acústica, a atenção dada a todos os sons (àgua, ranger da madeira, os passos, o fogo, o vento, a chuva), em particular o som dos elementos. Há também um sentido de composição próximo da pintura e uma mise en scène teatral, uma intensificação das sensações: o calor do fogo, a brancura do leite, a transparência do vidro, as mudanças de luz, etc. Há um derramamento de sensações, uma embriaguez com a vida que é muito intensa (Cf. a cena da criança que se maravilha com a teia de aranha, num dos seus filmes anteriores).

8. A presença da água: água podre/estagnada ou regeneradora/purificadora (ele diz-se “poeta da água pesada”, que olha a terra húmida) em confronto com o fogo destruidor/vital - é uma guerra cósmica, uma guerra simbólica entre o principio masculino e feminino do cosmos. A presença da terra: é um cineasta dos tons pastel, dos castanhos e dos ocres, das cores da paisagem russa, que podem ser as das estepes infinitas ou as da terra devastada. O homem ora é engolido pelo corredores e salas de esperas dos labirintos tecnocráticos ( em Solaris), consumido pela voragem implacável da história (espaços artificiais), ora é inquietado pelo vazio do espaço cósmico (o oceano em Solaris), ora é engolido pela proliferação da selvagem das formas naturais, pela vitalidade do informal associada à terra e ao feminino.

9. A questão do lugar e função da arte: a arte tem uma missão e uma vocação espiritual, mas ao mesmo tempo é impotente e insignificante, incapaz de consolação. A nossa civilização reduz o passado a objectos de museu que é sintoma da perda de confiança em relação à arte (há várias personagens que testemunham esse sentimento; Andrei Rubleiov renuncia à pintura perante o espectáculo do mal e da miséria), que se exasperam (e renunciam à arte) com a verborreia da arte face ao mal, à miséria e ao sofrimento. Tarkovski exige ao artista uma missão radical: salvar a humanidade (cf. as inúmeras e belíssimas variações sobre esta questão nos textos “A arte, anseio pelo ideal” e “A responsabilidade do artista”, incluídos no volume de ensaios Le temps scellé, que durante anos abriram o curso sobre os Escritos de Artistas). Daí a terrível ambiguidade da arte: superar as forças humanas, (ser promessa e abertura) ao mesmo tempo ser o espaço de um cepticismo desencantado (uma litania lírica e uma lamentação sobre as ruínas da história). A arte é ao mesmo tempo um acto de resistência e liberdade mas no nosso tempo, para Tarkovski, o cinema comercial consumou a entrega da arte à indústria cultural, ao mercado ou à propaganda.

10. A questão da solidão e da palavra/linguagem: heróis afectados pela indecisão e pela apatia, dilacerados, a força dos fracos, herói frágil (tema do homem desvitalizado, cortado da sua terra, desenraizado). Estes heróis errantes, sem destino, têm de passar pela provação da solidão. Estes heróis discutem questões metafísicas e religiosas: o mundo é ao mesmo tempo concreto, doloroso e irreal, habitado por presenças misteriosas, forças imperceptíveis, pela natureza. Em muitas cenas, as palavras lançadas não parecem dirigidas à pessoa presente (quase ausência do campo/contra-campo), mas lançadas a um universo iníquo que as ignora. O diálogo é um diálogo solitário com o universo, contraposição entre a potência impotente da linguagem e o mundo. Daí aparecerem personagens mudas ou personagens que se remetem ao silêncio fazendo um voto de mutismo, mas simultaneamente é como se abrissem espaço para a palavra do outro poder ecoar. É um cinema que oscila entre reduzir a palavra a ruído estéril ou mesmo opressor (uma suspeita irremissível recai sobre ela) e ao mesmo tempo pela maneira como as personagens habitam e são habitadas pelas suas próprias palavras, restituem à linguagem uma força que ela teria perdido (o silêncio é um meio de abrir para uma palavra por vir, para a “ressuscitar”). Daí toda a relação com a palavra ter um carácter místico, como uma nostalgia de uma plenitude anterior da palavra que se teria desnaturado, acompanhando a degradação espiritual do homem. A suspeita permanece.

11. A imagem é liberta da função de contar, deixa de estar submetida à narrativa e passa a ser uma superfície inquietante e interrogativa, pictórica, mas como se ela dissesse algo de diferente das personagens (o espaço é ele próprio um personagem, como se a relação figura fundo se pudesse inverter). Na imagem ecoa um mistério que é revelado e tornado patente pela imagem: o mistério da vida e da criação, os fluxos incompreensíveis do cosmos, mas que permanecem sempre desconhecidos e que temos sempre de redescobrir interminavelmente. O mundo terreno é um mundo que não pára de renascer e a imagem celebra ao mesmo tempo o repouso, a pacificação da paisagem e os movimentos de metamorfose perpétua. Ao mesmo tempo, no mundo humano desfilam acontecimentos impossíveis de acordo com as leis habituais do espaço e do tempo, desenhando um contraponto entre a natureza e a história humana.

12. A imagem é antes de mais aquilo que sintoniza o tempo do olhar, o tempo da atenção com o tempo do mundo: o seu elemento dominante é o tempo ou o ritmo do tempo espacializado, o passar do tempo no interior da “pressão de tempo” que aflora no plano. O tempo não se na montagem que constrói o encadeamento do filme mas apesar da montagem: a imagem é essa duração de tempo, como uma escultura feita imagem que usa o tempo como material escultórico. A imagem tem de ser o reflexo daquilo que vive na vida, daquilo que nela pulsa e vibra, tem de viver no tempo como o tempo vive ao passar pelas coisas. A imagem filma o que é sólido e visível, que parece resistir ao tempo mas também as marcas do tempo, da erosão e da destruição, como se o humano fosse feito da mesma matéria do universo: perecível, corruptível (o tempo como um ácido). O tempo é fixado na materialidade da vida até ao limite do seu desaparecimento total. A força do cinema para Tarkovski está em ser uma experiência de tempo: como se nele se visse a substância do tempo enquanto ele passa, como uma concentração ou condensação da vida humana que se abre e expõe testemunhando a experiência do tempo. O cineasta trabalha um bloco de sensações de tempo - uma massa de acontecimentos, gesto, movimentos, palavras no tempo - que são elevados a uma intensificação da atenção.

13. Algumas indicações sobre a maneira de filmar: a duração dos planos é prolongada até ao limite (alguns planos chegam a ter 9 minutos); encenação em profundidade, deslocação de personagens no eixo da profundidade; ângulos de captação das imagens de cima para baixo, planos em mergulho (como se fosse deus a observar a comédia humana, o céu é visto reflectido na água, a câmara não olha para o céu, uma elevação com o olhar voltada para baixo que é a sua assinatura), o corte seco para manter o espectador em estado de alerta, a fotografia que destaca a textura dos elementos, dos objectos da pele humana; muitas imagens vivem numa zona intermédia entre a cor e o preto e branco, sobrepondo vários níveis de realidade, o travelling lateral. A câmara trabalha por sedimentação, por camadas geológicas e e litográficas, filmando mineralmente.

14. O mundo está morre da materialidade só uma espiritualidade reencontrada o pode salvar: a espiritualidade de Tarkovski é vivida no peso, sobre a terra e sobre a lama - é nela que se vivem e inscrevem as experiências espirituais. Uma escala de correspondências entre o espírito e a matéria, a terra e a àgua são o signo definitivo da comunhão que liga o espírito à matéria.

15. As várias terras: terra das origens, intacta, a terra catástrofe/terra devastada/paisagens da desolação, detritos e escombros da pós-civilização e a terra transformada pelo homem/memoria do fazer. A terra desnaturada é marca do sentido mas também da barbárie e da afirmação indómita do poder. Criação e destruição: os dois rostos da natureza. A humidade como símbolo do divino e da terra sagrada. A identidade de cada um passa pelo olhar que ele lançar à terra.

16. Felizes os “simples de espírito” - é a eles que o cinema presta uma homenagem face aos seres perdidos no universo (os “intelectuais”), o ressentimento e o tédio, as faculdades embotadas, o desabamento espiritual, aquele que estuda acaba por forjar umas cadeias ao ficar obcecado pela verdade racional. Alexandre pensa o belo mas não o vive, diz-nos Tarkovski. É um fazedor de sistemas que joga com os pensamentos. O tema do fracasso, a dúvida, o não-compreender como benção. Só renunciando se salvam pelo sofrimento, como uma paixão que o atira para a lama, uma iniciação que é uma desaprendizagem do pensamento, afundado num mundo à beira da extinção. A perda do verbo e o início do verbo. A infância adultos que acabam loucos, numa infância mística.

17. A questão da espera: esperamos, esperamos e recomeçamos (Otto diz que se sente como alguém que passou a vida á espera numa estação de comboios – Godot). O tema do renascimento, de poder recomeçar radicalmente, o sonho de recomeçar, um novo nascimento. A regeneração é um retorno à infância. A passagem de testemunho. Reencontrar a palavra., uma palavra frágil como se fosse pronunciada sempre depois da catástrofe. Erguer-se depois da catástrofe.

Leituras: Michel Chion – Tarkovski, ed.cahiers du cinema; Antoine de Baecque, Tarkovski, ed.cahiers du cinema; Andrei Tarkovski - Le temps scellé, ed.cahiers du cinema

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

FILME 3: Tópicos de debate para "Fanny & Alexander", I. Bergman

Fanny & Alexander
Igmar Bergman
apresentado por Margarida Tavares

Em Fanny & Alexander, Ingmar Bergman cria um filme denso, com diversas camadas, onde o realizador fala da sua vida pessoal, da relação do real com o fantástico, da verdade e da mentira, de teatro e de cinema. O filme, na sua complexidade, tem muitas linhas de leitura possíveis. Aquela que me proponho enfatizar está centrada na presença do teatro dentro do filme:
1. O teatro e o realizador – carga autobiográfica – o protagonista, Alexander, faz remeter o filme não só para o universo da infância mas para a infância do próprio realizador – sinais disso: o fascínio que Alexander mostra pelo poder evocativo das imagens, das palavras e do teatro; a presença obsessiva da figura do Pai, tanto na omnipresença do pai que se estende para além da morte, como na figura do pai-substituto que o atormenta; o medo que “aprisiona” Alexander…
2. O teatro enquanto lugar da acção – o teatrinho de papel que entretém Alexander no início do filme; as cenas que se desenrolam no espaço do teatro da família Ekdahl - a cena de natividade, o ensaio da nova produção do teatro, Hamlet… - o teatro é, a par com a lanterna mágica e com os livros, o espaço mágico por onde Alexander transita como se de um contínuo com a vida se tratasse.
3. O teatro enquanto lugar das máscaras – a temática da identidade presente na permanente alusão à máscara (personagem) – Carl Ekdahl sente-se como um Hamlet, príncipe deposto – Óscar Ekdahl é um fantasma antes de o ser (no momento da morte, representa no teatro o Fantasma da peça; antes de partir diz a Emilie que nunca os deixará e agarra-se ao braço de Alexander como um vivo que já é morto) – o Bispo diz a Emilie que ela usa tantas máscaras que não sabe quem é, enquanto ele, Bispo, tem apenas uma máscara que lhe está colada à carne – Isak, quando vai a casa do Bispo buscar as crianças, representa o papel do judeu servil - Aron diz que o mundo é feito de realidades, umas por fora das outras…
4. Textos de teatro como intertextos do filme: Hamlet, de Shakespeare - com uma presença directa na acção do filme (os ensaios da peça) e indirecta (na temática do fantasma do pai/padrasto; na temática do príncipe deposto – Carl deposto pelo irmão nos negócios da família, Óscar deposto pelo Bispo que, logo no próprio funeral, planeia casar com Emilie; Alexander que é deposto pelo Bispo no seu lugar junto da mãe…). O sonho, de Strindberg[1] - com uma presença essencialmente temática – o que é Real e o que é Sonho; o que é Verdade e o que é Mentira – e uma alusão directa, no final, quando Emilie dá o texto de Strindberg a Helena para esta o ler e o encenarem na próxima temporada do teatro.


[1] Na sua biografia literária, Lanterna Mágica, Bergman conta que viu esta peça pela 1ª vez quando tinha doze anos e que foi a primeira vez na sua vida que presenciou “a magia da arte de representar” (p. 40); ao longo da sua vida encenou esta peça 4 vezes.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

FILME 1 : tópicos de debate para "one Week", B. Keaton

One Week, 1920
Buster Keaton & Edward Cline
apresentado por Isabel Baraona

Buster Keaton é, por muitas e variadas razões, uma referência incontornável na história do cinema todavia, esta breve introdução é um comentário muito pessoal sobre as razões que me levam a apresentá-lo no ciclo de cinema e debate. Keaton é um excelente actor e desempenha o papel de um personagem pelo qual facilmente sentimos uma forte empatia. Começo por destacar apenas duas características:

1. persistência e sobrevivência :Buster Keaton interpreta, regra geral, um personagem com poucos recursos económicos que aspira a uma vida melhor, por si e pela sua amada. Keaton é cândido e parece intimidado pelas pessoas ou circunstâncias. E por isso, sofre com a dificuldade em encontrar e afirmar o seu lugar num mundo cheio de surpresas e por vezes, também confuso e conflituoso. Embora aparente ser fisicamente frágil é extraordinariamente resistente e revela-se muito mais hábil do que inicialmente supomos.
2. capacidade de inventar: Aliada a esse instinto de sobrevivência e talvez devido a ele, Keaton mostra ter uma capacidade quase inesgotável de inventar soluções e mecanismos, fabricando um grande número de objectos que o auxiliam a desenvencilhar-se de embaraços. Apesar do absurdo das situações em que se vê envolvido é atento e astuto, encontrando soluções inesperadas para ultrapassar dificuldades.

É difícil escolher (apenas) um filme mas proponho apresentar One week. Como o título indica, a acção desenvolve-se no período de uma semana, durante a qual Keaton constrói e inaugura a sua nova casa pré-fabricada. Uma folha de calendário a ser arrancada é o mote de cada sequência de acção. Este é um filme que prima pelo detalhe, destaco apenas um exemplo, retirado da sequência iniciada após a indicação”5ªfeira”: notem quão elegante é a filmagem feita na casa de banho, uma mão cobre com pudor o olhar (o nosso olhar) para que a personagem feminina possa apanhar o sabonete que deixou cair.
Um último comentário para os que acham que filmes a preto e branco, de 1920 são anacrónicos. Estejam verdadeiramente atentos à cultura popular – e vejam a MTV[1] para compreender a herança e a modernidade destes primeiros cineastas.

[1]Os cenários do vídeo produzido para divulgação de Otherside, música de RedHotChili Peppers (álbumCalifornication, 1999) são decalcados de The Cabinet of Dr. Caligari, filme expressionista alemão dirigido por R. Wiene em 1920. Outro exemplo: os cenários do vídeo produzido para a divulgação de Tonight, Tonight música de Smashing Pumpkins (álbum Mellon Collie and the Infinite Sadness, 1996) são claramente uma reinterpretação de Viagem à Lua, célebre filme de Georges Méliès, estreado em 1902

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

CICLO CINEMA E DEBATE 2009



One Week (1920) .........................................04 de Novembro
Buster Keaton & Edward Cline
Moderadora: Isabel Baraona

Dreams That Money Can Buy (1947)..........11 de Novembro
Hans Richter
Moderador: Nelson Guerreiro

Fanny & Alexander (1982).........................18 de Novembro
Ingmar Bergman
Moderadora: Margarida Tavares

O Sacrifício (1986)........................................25 de Novembro
Andrei Tarkovski
Moderador: Rodrigo Silva

Caché (2005)..............................................02 de Dezembro
Michael Haneke
Moderador: José Carlos Teixeira


todas as SESSÕES terão lugar no
auditório do edifício ped. 1, às 17h.

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Ciclo de Cinema e Debate 2008-09

O Ciclo de Cinema e Debate “10 décadas de cinema: dos anos 10 a 2000”, pretende divulgar grandes clássicos do cinema, filmes de referência que “falam” em qualquer época. Foi seleccionado um filme por década e convidada uma personalidade de relevo da nossa cultura para animar o debate que se segue após a projecção de cada filme.


década de 10
22 de Outubro de 2008
Intolerância (Griffith), 1916, 177 m.
Moderador: João B. Serra (historiador)

década de 20
29 de Outubro de 2008
A Caixa de Pandora (Pabst) 1929, 104 m.
Moderadora: Maria Lúcia Lepecki (ensaísta)

década de 30
5 de Novembro de 2008
Frankenstein (J. Whale) 1931, 68 m.
Moderador: Alexandre Quintanilha (Biólogo)

década de 40
3 de Dezembro de 2008
Relíquia Macabra (J. Huston) 1941, 96 m.
Moderador: Laborinho Lúcio (magistrado)

década de 50
12 de Novembro de 2008
Macbeth (O.Welles) 1948, 87 min.
Moderador: José Pedro Serra (prof. ensino superior)

década de 60
26 de Novembro de 2008
West Side Story (R. Wise/J. Robbins) 1961, 145 m.
Moderador: Vasco Wellenkamp (coreógrafo e bailarino)

década de 70
19 de Novembro de 2008
Alice in the Cities (W. Wenders) 1974, 107 m.
Debate livre

década de 80
10 de Dezembro de 2008
Apocalypse Now (F. F. Coppola) 1979, 153 m.
Moderador: Garcia Leandro (general na reserva)

década de 90
14 de Janeiro de 2009
Onde Jaz o teu sorriso? (Pedro Costa) 2001, 102 min.
Moderador: José Neves (arquitecto)

2000
21 de Janeiro de 2009
Cartas a uma Ditadura (Inês de Medeiros) 2008, 60 m.
Moderadora: Irene Pimentel (historiadora)

CICLO DE CINEMA E DEBATE 2007


O ciclo de cinema e debate deste ano lectivo é dedicado ao tema ‘PENSAR ATRAVÉS DAS IMAGENS’. Sessões no edifício pedagógico 1, auditório

1ª SESSÃO - Verdade ou Mentira

título original : Shattered glass
Realização: Billy Ray
Ano: 2003
Duração: 96 min.


Exibido a 12 de Novembro de 2007

Debate conduzido por Paulo Martins
Tema do debate : A CONSTRUÇÃO DO REAL



O mundo da comunicação social tem como base a representação do real. Neste caso concreto, uma representação que se pretende verdadeira. Mas será que é mesmo assim?

Este filme baseia-se em factos reais, narrando a história do jornalista americano Stephen Glass, um jovem que tinha 24 anos quando começou a trabalhar na revista “The New Republic”. Aí permaneceu três anos, entre 1995 e 1998. Entrou como simples estagiário e rapidamente se transformou num brilhante cronista, com artigos de investigação sobre temas actuais. Mas a veracidade de uma das suas reportagens foi posta em causa. Iniciou-se um processo, envolvendo os superiores hierárquicos, colegas e amigos. No final, descobriu-se que 27 dos 41 artigos que publicara eram falsos, quer na sua totalidade, quer parcialmente. Alguns eram completamente inventados. O choque foi grande…

Que tipo de motivação leva uma pessoa a mentir, a inventar fontes e a falsear histórias? A fama? A tentativa de se destacar num mercado competitivo? Mostrar a todos que era melhor que os colegas? Construir a auto-estima?

Em relação à revista e aos seus editores as consequências também foram graves. Perdeu a confiança dos leitores e tornou claro ao público que muitos dos artigos são escritos por estagiários. A credibilidade foi afectada, sendo um duro golpe para uma revista lida no avião presidencial “Air Force One”.

O mundo das Artes e da criatividade é competitivo. As intrigas e invejas abundam. Curiosamente, quem desvendou este caso foi uma outra revista, onde os jornalistas e estagiários, apesar da competição, resolveram trabalhar em equipa.

No final, há uma interrogação que se mantém. Qual a verdadeira motivação individual do artista, neste caso um escritor de crónicas jornalísticas: provocar? Representar a realidade? Transmitir a sua visão dos factos, independentemente da sua veracidade? Tentar reproduzir a beleza ou a fealdade que nos rodeia? Utilizar a arte como denúncia e, nesse caso, ao serviço de quem? Dos nossos interesses, ou da própria realidade? E, por fim, uma pergunta essencial a qualquer autor: que representação fazemos nós próprios de nós mesmos? E em que medida essa representação pessoal afecta a percepção da realidade que nos rodeia e a que representaremos posteriormente?

Lanço estas (e outras perguntas que surgirão por arrastamento) para o debate de hoje. Mas faço uma advertência: vale a pena ver o filme para podermos equacionar melhor as nossas respostas. Um artigo publicado em 2005 na revista Journal of Communication Inquiry, por Matthew C. Ehrlich, intitulado Shattered Glass, Movies, and the Free Press Myth, pode, também, ajudar-nos a encontrar boas pistas de análise.

2ª SESSÃO - A Costa dos Murmúrios

Realização: Margarida Cardoso
Ano: 2004
Duração: 115 min.

Exibido a 15 de Novembro de 2007


Convidada: Margarida Cardoso
Debate conduzido por Maria Madalena Gonçalves
Tema do debate : ADAPTAÇÃO: DO LIVRO AO FILME


- Um livro é um livro e um filme é um filme. Cada um vale por si. Partindo desta evidência, gostaria de começar por perguntar o que é que a realizadora Margarida Cardoso viu no livro da escritora Lídia Jorge capaz de ser transposto para o ecrã? Em seguida, gostava que nos dissesse o que é que excluiu deliberadamente do livro e reteve para núcleo duro do seu texto fílmico.
- Tendo sido sensível à tentativa de conciliação entre memória e realidade (que me parece ser uma questão crucial a respeito da guerra colonial presente tanto no livro como no filme), pergunto-lhe se tecnicamente resolveu esta questão servindo-se da narração off de Evita Lobo.
- Haverá, certamente, das várias cenas filmadas uma que lhe diz mais do que as outras. Qual e porquê?
– Proponho que nos concentremos na cena do tiro às aves (a cena dos flamingos). Uma vez que muitos dos estudantes aqui presentes estudam “som e imagem”, aproveitava a ocasião para lhe pedir que nos falasse dos códigos da mise-en-scène utilizados na filmagem desta cena: iluminação, enquadramento, disposição dos actores, movimento da câmara, etc… Como utilizou o texto de Lídia Jorge neste particular?
– Uma última questão que lanço para o debate. Há quem diga que A Costa dos Murmúrios apresenta algumas afinidades com Os Verdes Anos[1] e Hiroshima, mon amour[2].



[1] Os Verdes Anos, realizador Paulo Rocha, estreado em 1963.
[2] Hiroshima, mon amour, realizador Alain Resnais, estreado em 1959.

3ª SESSÃO - Perigo na Noite

título original: Frenzy
Realização: Alfred Hitchcock
Ano: 1972
Duração: 118 min.

Exibido a 19 de Novembro de 2007


Debate conduzido por João B. Serra
Tema do debate : HITCHCOCK: HUMOR E MALDADE


Frenzy é o 55º filme de um cineasta que realizou, entre 1925 e 1976, nada menos que 56 filmes. Alfred Hitchcock nasceu em 1889 e morreu em 1980. Londrino, foi o autor do primeiro filme falado britânico. Em 1939, emigrou para os Estados Unidos, onde se consagrou como figura cimeira da indústria cinematográfica de Hollywood, criando a sua própria empresa produtora de filmes. No final da década de 50 e anos 60, depois de ter realizado Janela Indiscreta (1954), foi “descoberto” pelos críticos e cineastas da Nouvelle Vague francesa (Claude Chabrol, Eric Rohmer, François Truffaut), reforçando o seu prestígio na Europa. Alguns dos seus filmes antológicos são desse período: A Mulher que Viveu Duas Vezes (1958), Psico (1960), Os Pássaros (1963), Marnie (1964), Cortina Rasgada (1966).

Em 1970 voltou a Londres para rodar Frenzy. Poucos anos antes, Hitchcock tinha começado a trabalhar no argumento de um filme-documentário sobre um “serial killer” londrino que seduzia as mulheres antes de as matar, Neville Heath. O projecto deste fime cujo título seria Caleidoscópio incluía muitas cenas realistas, filmadas à mão, e a Universal rejeitou-o. Sucede que o primeiro título de Caleidoscópio fora precisamente Frenzy.

Frenzy tem por base os actos de um “serial killer” que viola as suas vítimas e as asfixia com a sua própria gravata. Covent Garden propiciou a Hitchcock as mais marcantes cenas de exterior de Frenzy. Como este mercado tradicional da cidade iria desaparecer pouco depois, podemos ver nesta escolha não só a homenagem que o realizador quis prestar a seu pai (vendedor de frutas e hortaliças em Covent Garden) como a transposição para este filme do intuito documental previsto para o filme recusado.
Hitchcock integrou esta produção não apenas no ambiente da cidade de Londres – com diversas referências aos seus emblemas urbanos – o Tamisa, a Tower Bridge, com as suas pontes basculantes – mas no sistema britânico de produção cinematográfica, recorrendo, por exemplo, a actores com experiência de palco mas não a estrelas do cinema.
O universo hitchcockiano é bem reconhecível neste penúltimo filme de uma longa carreira. Lá está, em doses específicas, uma história policial, a maldade humana, o humor carregado (humor negro), o jogo de sentimentos (o romance), o suspense. Mas está lá, sobretudo, um conjunto de procedimentos técnicos e artísticos que fizeram de Hitchcok um dos mestres da narrativa cinematográfica, e uma atenção aos pormenores que fazem dos seus filmes inesquecíveis momentos de mistério e divertimento.

Salientarei alguns desses procedimentos técnicos e alguns desses momentos inesquecíveis.
Quanto aos primeiros:
- a presença de Hitch no comício junto ao Tamisa.
- a violação e estrangulamento de Mrs. Blaney, num reduzidíssimo espaço de um escritório.
- a “descoberta” de Mrs Blaney pela secretária.
- o encontro entre Babs e Rusk, depois de ela sair do Pub.
- a despedida a Babs.
- a falta do alfinete de gravata.
- Rusk às voltas com o cadáver de Babs (140 takes).
- a sentença do tribunal.
- o desmarcaramento do “serial killer”.


Quanto aos segundos (em registo de humor negro):
- referências aos rins e fígado das vítimas do Estripador por um dos espectadores da recolha do primeiro cadáver.
- relação entre assassínios em série e turismo feitas pelos dois cavalheiros no pub.
- as referências às batatas e às uvas (“peal me the grape”, as uvas que acompanham a perdiz).
- um assassino que palita os dentes com um alfinete de gravata.
- as refeições confeccionadas por Mrs Oxford.
- a quebra de gressinos operada por Mrs Oxford enquanto ouve o relato do marido sobre a forma como o assassino retirou o alfinete da mão em “rigor mortis” da sua vítima.
- a teoria de que, apesar de tudo, o casamento defende melhor os indivíduos: os dois casais do filme (Oxford e Forsythe), embora não harmoniosos, não incorrem nos riscos das personagens não casados: um é preso por um crime que não cometeu, outro é um psicopata, duas são assassinadas e o espectador teme pela secretária de Mrs. Blaney.
- que pode esperar Blaney depois de reconhecido o verdadeiro culpado? um jantar de pato com espesso molho de cerejas preparado por Mrs Oxford…

4ª SESSÃO - Fahrenheit 451

Realização: François Truffaut
Ano: 1966
Duração: 112 min.

Exibido a 22 de Novembro de 2007


Debate conduzido por Rodrigo Silva
Tema do debate : O CONTROLO DA REPRESENTAÇÃO



Cinco questões sobre “Fahrenheit 451”:

1. Questão do totalitarismo e das sociedades de controlo, da biopolítica. A liberdade é asfixiada pelos sistemas simbólicos, sistemas de transmissão, de mediação, e pelo uso que os aparelhos de Estado fazem deles. A fabricação do consentimento através da propaganda é disseminada por todos os gestos do quotidiano; tudo foi invadido porque tudo foi integralmente apropriado pela mecânica implacável da vigilância generalizada e pelo policiamento securitário, que converteu o espaço público, o espaço da acção livre, num espaço codificado pela máquina administrativa e burocrática.

2. Questão da memória colectiva e da consciência histórica: a ordem monolítica e massificada das instituições colectivas controlam os sistemas de representação, fazendo valer apenas uma versão da vida colectiva e uma visão do mundo, sem pluralidade, sem lugar para a singularidade do indivíduo. Deixa de haver histórias individuais, mas apenas a dissolução do indivíduo enquanto elemento sacrificial de um colectivo – destruição da memória e das recordações de cada um. Desaparecem os gestos e práticas que constituem a individuação como singularidade idiomática.


3. Questão do tempo e do espaço: um presente eternizado, um limbo suspenso, sem passado não há projecção no futuro. Uniformização de todos os lugares, que estão mapeados, cartografados e coreografados de acordo com a mise en scène idealizada do poder - asséptica, higienista, funcionalizada, normalizada. Amnésia organizada e perda da memória numa sociedade que esqueceu a negatividade e a tragédia da história. Absolutização e imersão num presente ubíquo que é o da realidade construída e mantida pelos dispositivos do poder.

4. Questão das formas de entertainment e distracção organizada como forma de anestesia apática da consciência crítica: há uma estranha familiaridade com cenários e formas de vida de hoje e que tem a ver com as distopias forçadas pelo século XX. O futurismo da ficção científica antecipa muitas das características embrionárias da civilização tecnológica (o filme é de 1966).

5. Questão da possibilidade da resistência, da subversão. Reinvindicação como dissidência criadora: Montag como o homem que recupera o espírito crítico (pensar por si próprio, a partir da memória dos que o fizeram escrevendo livros) e a autonomia do pensamento através da leitura (a solidão e o distanciamento que abrem o espaço da insubmissão e da insurreição poética. O protagonista acabará por se tornar um dos “homens-livro”). Montag rejeita e deixa de aceitar o conformismo e o consentimento, porque a memória dos livros é o recurso para a verdadeira liberdade que é a liberdade interior - numa sociedade onde já não há liberdade exterior porque a exterioridade, a vida pública, está inteiramente refém das palavras de ordem, das enunciações e visibilidades que são programadas e que confiscaram o espaço do possível. O pensamento, a leitura: práticas da insubmissão.

5ª SESSÃO - Images of the world and inscription of war

Título original: Bilder der welt und Inschrift des Krieges
Realizador: Harun Farocki
Ano: 1988
Duração: 75 min.

Exibido a 26 de Novembro de 2007


Debate conduzido por Susana Duarte
Tema do debate : A MONTAGEM: ENTRE A PALAVRA E A IMAGEM


Imagens do mundo e a inscrição da guerra reúne aspectos cruciais da teoria e prática fílmica de Farocki. Nesta sua obra, há dois grupos de imagens fundamentais, retomadas em sucessivos reenquadramentos, que condensam as preocupações do filme, clarificando a convocação das outras séries de imagens: o das fotografias aéreas tiradas pelos bombardeiros aliados americanos, em 1944, e o correspondente ao álbum de Auschwitz, com fotografias tiradas por um SS, na rampa do campo, ambos produtos de uma tecnologia incorporada a uma maquinaria calculada de morte e aniquilação. Neles converge o que a banda de imagens e de palavra vai sublinhando e dando a ler através da alternância entre as imagens dos aparatos de medição (militares, científicos, industriais) e as imagens produzidas por esses meios, a saber, que o propósito de produção destas imagens-técnicas, prefigurado pela fotografia mas estendendo-se para além dela, independentemente dos seus fins científicos, militares, forenses, ou estéticos, foi não só registar e preservar, mas também ocultar e destruir.
Em Abril de 1944, pilotos americanos sobrevoam a Silésia à procura de uma fábrica de armamentos e registam fotografias de reconhecimento. De regresso a Inglaterra, os analistas identificam os alvos industriais, mas não vêem os telhados dos barracões e as câmaras de gás de Auschwitz. Nas fotografias aéreas de Auschwitz, em que o campo de extermínio na imagem só é visível em 1977, estamos perante imagens que se organizam em torno de uma zona cega, o que nos permite confirmar que “Imagens do mundo e a inscrição da guerra” é um filme sobre a manifestação de uma desadequação entre o olho e os dispositivos tecnológicos de visão, sobre a relação da visão natural com uma dimensão de opacidade e invisibilidade inscrita no visível artificialmente construído. A fotografia aérea é uma imagem-técnica. Apesar de ser um registo analógico aponta já, com o seu sistema em grelha, para o modo digital, como notou Vilém Flusser. Os seres humanos individuais ficam fora da grelha, e só o ornamento da sua existência de grupo fica registado: por exemplo, quando se alinham nos pátios para a selecção ou a chamada. Com efeito, a visibilidade permitida pelo alcance óptico da fotografia aérea esbarra com uma dissimulação muito mais radical do que a encetada pelo inimigo, para evitar, segundo uma expressão de Paul Virilio, que “o percebido seja sinónimo de imediatamente perdido” – aquela que resulta de uma incapacidade para ver o que a fotografia objectivamente contém, mas o olho não está preparado para reconhecer.
Farocki está interessado no modo como a câmara se tornou um elemento inseparável do equipamento destruição. O que é preservado na fotografia de Auschwitz é, ao mesmo tempo, uma imagem da destruição efectivamente consumada e da destruição que não chegou a ter lugar e que a poderia ter evitado.
O filme transmite, assim, um sentimento simultaneamente de perigo e de impotência em relação à óptica global de controlo do território: se a destruição implica que haja imagem, a destruição impedida dificilmente encontra a sua resposta numa terra sob vigilância, pois não há resposta, nem intervenção, ou crítica, em relação à destruição, quando o olhar e o pensamento são meras funções de máquinas que determinam, em articulação com a ciência e os fins militares, o que faz sentido investigar. Por sua vez, a imagem da mulher, na chegada ao campo, é tirada por um SS. Referir, como o faz a voz off do comentário, que a fotografia parece resultar de um impulso de fascinação – um homem que olha uma mulher e resgata a sua beleza para a posteridade – e, que, juntamente com o olhar da mulher, evoca o mundo exterior aos campos, permite ao filme sublinhar que o significado desta imagem se joga precisamente na distinção entre o curso normal da vida antes deste momento e as disposições que regulam o campo e ditarão a morte desta mulher. O dispositivo fotográfico que a fixa e preserva, no qual o fotógrafo se incui, não se distingue do campo de extermínio que entende a sua vida como supérflua. A fotografia inscreve-se na máquina burocrático-militar de destruição nazi. Vale a pena chamar aqui a atenção para a aproximação que Farocki estabelece, pela montagem, entre máquinas de visão usadas pelos carrascos e os equipamentos e autómatos de produção industrial, reforçando mais uma vez a disfunção entre o olho e o aparato: ambos são sem subjectividade, reduzidos a meros procedimentos de verificação técnica e operacional do funcionamento das coisas, eliminando o papel desempenhado pela visão natural no seu interior[i].

As duas imagens analisadas encarnam o modo técnico da escrita histórica e Farocki fá-las contrastar, já no final do filme, sobretudo através do comentário, com uma outra categoria de imagens, as que resultam da narração feita pelos dois prisioneiros, Rudolf Vra e Alfred Wetzler, que conseguiram fugir de Auschwitz e dão conta da realidade do campo através da sua condição física de testemunhas oculares. Esta aproximação final entre estes dois tipos de narração retroage sobre as várias direcções de movimento do filme que os dois grupos de imagens de Auschwitz representam ao mesmo tempo, e acrescenta-lhe mais uma, de contornos fundamentais: a fotografia, enquanto ferramenta matemática de conhecimento operacional e cálculo sobre o mundo, preconizadora das contemporâneas imagens numéricas, constitui um ponto de viragem na história humana, em que ambos os tipos de narração, ambos os tipos de imagens, se mostram inadequados. Não é possível optar por uma ou outra, pela imagem ou pela palavra, antes tem que se tentar estabelecer uma relação entre as duas. Esta ideia, reconhecemo-la em obra no próprio filme: o método de escrita de Farocki constitui-se a partir desta diferença, entre texto e imagem, sendo na sua manifestação que o filme acontece. Parafraseando o próprio realizador, uma imagem pode elucidar a outra, dar-lhe alguma validade experiencial; uma palavra - Aufklarung, por exemplo - transporta duplos e triplos sentidos, reúne várias coisas distintas, sugerindo, pelo seu potencial, conexões no mundo real, no material visual, na fábrica argumentativa do filme. No entanto, a linha dramatúrgica não está nem num sítio, nem no outro, está num outro lugar. Algures na mente de quem vê, nas imagens e representações mentais que a montagem, isto é, o entrelaçamento e os intervalos entre palavra e imagem, permite, nas conexões que são feitas de todas as combinações, na estrutura de loops que o filme propõe.[ii]



[i][i] A propósito do filme, Farocki afirma, numa entrevista a Thomas Elsaesser, que as imagens, fundamentais para a nossa cultura, estão a desaparecer: foram durante anos suportes perceptivos e conceptuais centrais e agora são uma mera concessão ao interface humano, pois as máquinas não precisam de imagens, podem fazer as suas visualizações e conceptualizações com cálculos matemáticos. Thomas Elsaesser aponta, por sua vez, para a possibilidade de ler aqui uma conexão histórica entre o fascismo e a realidade virtual: para ambos, o interface humano cai fora da equação enquanto irrelevância dispendiosa e embaraçosa. C.f. ELSSAESSER, Th. (1993), “Making the world superfluous: an interview with Harun Farocki”, in ELSSAESSER, T. (2004), Harun Farocki, Working on the sight-lines, Amsterdam: Amsterdam University Press: 177-189.

[ii] Ibid.
[iii][iii] A propósito do filme, Farocki afirma, numa entrevista a Thomas Elsaesser, que as imagens, fundamentais para a nossa cultura, estão a desaparecer: foram durante anos suportes perceptivos e conceptuais centrais e agora são uma mera concessão ao interface humano, pois as máquinas não precisam de imagens, podem fazer as suas visualizações e conceptualizações com cálculos matemáticos. Thomas Elsaesser aponta, por sua vez, para a possibilidade de ler aqui uma conexão histórica entre o fascismo e a realidade virtual: para ambos, o interface humano cai fora da equação enquanto irrelevância dispendiosa e embaraçosa. C.f. ELSSAESSER, Th. (1993), “Making the world superfluous: an interview with Harun Farocki”, in ELSSAESSER, T. (2004), Harun Farocki, Working on the sight-lines, Amsterdam: Amsterdam University Press: 177-189.
[iv] Ibid.

6ª SESSÃO - Blade Runner

Realização: Ridley Scott
Ano: 1982
Duração: 117 min.

Exibido a 29 de Novembro de 2007


Debate conduzido por Luísa Arroz Albuquerque
Tema do debate : MEMÓRIA, IDENTIDADE E TECNOLOGIA


O longo plano – sequência inicial do filme – apresenta-nos Los Angeles em 2019. Lentamente vamo-nos aproximando da cidade, à medida que chaminés de grandes refinarias industriais explodem à nossa frente. Este lento plano inicial, que valeu a “blade runner” o título da crítica de “blade crawler”, é entrecortado por um pequeno plano relâmpago de um olho no qual se espelha uma dessas explosões. Após esta apresentação neo-noir da cidade do futuro, entramos nos escritórios da Tyrell Corporation onde um replicante – um robot aparentemente humano – é submetido a um teste de Voight-kampff. As primeiras cenas de Blade Runner dão-nos as indicações temporais (2019), espaciais (Los Angeles) e o tema central do filme: distinguir humanos e replicantes. Deckart (Harrison Ford), que aparece pouco depois numa movimentada rua de Los Angeles, é um Blade Runner, um polícia especializado na caça aos replicantes que fogem das colónias “Off World” e regressam indevidamente à terra. O argumento do filme é adaptado da história de Philip K. Dick, Do Androids Dream of Electric Sheep?, uma desconstrução das noções de tecnologia, simulacro e identidade. Obviamente que há diferenças entre o filme e a história em que este se baseia. K. Dick valoriza as consequências ambientais do desenvolvimento tecnológico e a sobrevalorização da biologia natural, numa sociedade em que os andróides estão por todo o lado. Na adaptação de Scott, os replicantes (andróides) estão proibidos na terra, depois de um motim, que origina não só a proibição, mas a introdução de uma longevidade máxima de quatro anos, impedindo-os de criarem emoções e memórias. Este é, aliás, o motivo pelo qual, Zhora (Joanna Cassidy), Pris (Daryl Hannah) e Roy (Rutger Hauer) regressam à terra: tentar junto do criador alargar a sua longevidade. No entanto, o eco-desastre está presente no caos urbano, no ambiente poluído, na densidade populacional e na industrialização pesada que constituem o cenário do filme. A questão central do filme é, antes de mais, a natureza do humano num futuro pós-moderno, no qual a hibridação homem-máquina, a engenharia genética e a nanotecnologia atingem todo o seu potencial, recriando seres naturais que o desenvolvimento tecnológico erradicou da terra em clara ruptura ambiental. A cena chave que introduz esta questão está dada no diálogo entre Deckard e Tyrell, o criador do novo Nexus 6, após o teste a Rachel (Sean Young):

Tyrell: Commerce is our goal here at Tyrell. More human than human is our motto. Rachel is an experiment, nothing more. We began to recognize in them a strange obsession. After all, they are emotionally inexperienced with only a few years in which to store up the experiences which you and I take for granted. If we give them the past, we create a cushion or pillow for their emotions and consequently we can control them better.
Deckard: Memories. You’re talking about memories.


No fundo, falamos de memória e identidade, de um passado que humaniza os replicantes mas também de todo o aparato técnico que manipula a percepção: a imagem, a fotografia, o filme e a simulação de um passado. Não por acaso, existem vários planos que focam os olhos e a visão. A diferença entre a aparência e a essência dos andróides estabelece-se exactamente na memória e na identidade. O simples “penso, logo existo”, que distingue o ser humano de todo o mundo animal, poderia ter-se tornado em Blade Runner em “sinto, logo sou humano”. Mas como podemos observar nas frases finais de Roy, também esse moto se pode aplicar aos replicantes.
Blade Runner é, a par do romance de William Gibson, Neuromancer, um dos marcos iniciais do género cyberpunk na ficção científica. Quando foi lançado em 1982, Blade Runner foi um fracasso comercial tendo sido rapidamente retirado das salas. Foi através do circuito de aluguer de vídeo e da exibição da televisão que Blade Runner se transformou num filme de culto, tendo sido eleito recentemente como um dos filmes mais importantes do século XX. Envolvido em polémica, e sem o acordo do realizador, a Warner Bros lançou em 1991 a versão do Director’s Cut que retira a voz off e modifica o final. Para Dezembro deste ano está previsto o lançamento da versão Director´s Cut[1], desta vez com o acordo de Ridley Scott.




[1] O “Final Cut” de Blade Runner passou a estar disponível num DVD de dois discos, nas edições Castello Lopes, a partir de Dezembro de 2007. No disco 1, encontra-se a cópia do filme restaurada, assim como sequências novas, efeitos especiais e comentários de Ridley Scott; no disco 2, encontram-se cenas que tinham sido excluídas e um documentário sobre o “making of de Blade Runner”.

7ª SESSÃO - La Nuit Américaine

Realização: François Truffaut
Ano: 1973
Duração: 112 min.

Exibido a 3 de Dezembro de 2007


Debate conduzido por Nelson Guerreiro
Tema do debate : POR DETRÁS DA CÂMARA: O PROCESSO CRIATIVO

“Tranquilize-se quem deseja ter vivido, enquanto vivia,
que a vida dir-lhe-á como isso se faz.”
Samuel Beckett, O Inominável

A escolha deste filme deveu-se, em primeiro lugar, à minha profunda admiração pela obra imensa de François Truffaut. Em segundo lugar, porque este filme nos faz aceder aos seus modos de produção cinematográfica de um ponto de vista funcional, mas, sobretudo, à forma como Truffaut vê o (seu) cinema, num gesto intensivo pelo que declara o seu amor incondicional à 7ª arte. Não abdicando de apresentar os motivos que o encaminharam à realização de filmes, entrecorta a acção em flashbacks, com as relembranças do seu alter-ego, Ferrand da sua infância, quando roubava posters dos filmes em cartaz (entre eles, Citizen Kane, de Orson Welles). Travessuras que o próprio Truffaut confessou que fazia.

Por outro lado, La Nuit Américaine é um dos filmes que melhor retrata as peripécias que se passam no plateau e na rodagem de um filme. Está lá tudo, às escâncaras. Desnudamento imperativo. Abertura máxima e pessoal, através da qual nada fica por mostrar. Num retrato, por vezes, hiper-realista, Truffaut faz de um making-of de um filme fictício Je vous presente Pamela a linha narrativa, catalogando, de forma livre – mas em forma de tese -, os problemas de bastidores passíveis de ocorrer no processo executivo de um filme: os conflitos com e entre os actores, os imprevistos, os estouros de cronograma e as pressões externas.

De forma caricatural, estilizando a seu bel-prazer a partir de uma agilização da sua experiência, apresenta-nos o dia-a-dia das filmagens com todas as atribulações de uma arte que depende, acima de tudo, do domínio da técnica. Porém, e no confronto dessa matriz essencial, embate com a precariedade e imprevisibilidade da matéria humana, lembra-nos que o cinema assenta também, em termos operativos, no colectivo – logo, tendente à falha, em que a sua prática também pressupõe a resolução de problemas fora da sua estrutura, através de soluções improvisadas para concluir o projecto a tempo. Por exemplo, furtar um vaso do hotel onde o elenco estava hospedado para compor o cenário da casa de "Pamela". Ou como lidar com um actor (protagonista) que fica deprimido porque a sua noiva sai com um duplo, ou como lidar com uma actriz, repescada a partir da sua aura fora de validade, que se entregou à bebida e que não se consegue lembrar das suas falas, entre muitas outras confusões, em relação às quais o realizador, como centro nevrálgico das operações, deve fazer tudo para contornar, até chegar à gravação de uma das cenas mais importantes do filme: aquela em que o dia deve ser transformado em noite artificialmente. A day for night, ou effetto notte (em italiano), ou noite americana (em português) – expressão, utilizada de forma titular, de origem americana, para definir aquele artifício que o cinema tem ao colocar filtros especiais na câmara para fazer noite quando ainda é dia.

Como se depreende, e do ponto de vista narrativo, a história é árida. Não podia ser de outra maneira, visto que estamos perante um filme, metalinguisticamente falando, dentro do cinema. Visto que estamos ora dentro, ora fora de campo, acedendo a algo que, geralmente, não nos é dado a ver e contrariando a missiva de que no cinema, tal como o próprio na pele de Ferrand o diz, “não há engarrafamentos, nem vazios, nem tempos mortos. Os filmes avançam como comboios na noite.” Afirmando que o cinema é, acima de tudo, a reunião de coisas, pessoas e paisagens que lhe servem de base, no fundo, a vida, a qual, em sua opinião, não costuma ser tão bem agenciada, Truffaut parece querer confirmar o ditado que diz que a vida não tem ensaio geral. Assim sendo, o que é mais importante: a vida ou os filmes? Resposta-tipo de Truffaut: …

Contudo, numa entrevista concedida em 1973, Truffaut dizia, com alguma ênfase, que, por pensar em cinema tantas horas por dia e há tantos anos, não conseguia deixar de comparar a vida e os filmes, e de lastimar que a vida é tão interessante, densa e intensa quanto as imagens; para acrescentar, algo timidamente, que a vida, apesar de tudo, lhe parecia mais importante. Mais como uma espécie de capitulação momentânea diante de um olhar social (como pode um filme significar mais do que a vida?) do que como expressão sincera da sua interioridade, a “concessão” de Truffaut a uma resposta mais “racional” é claramente desmentida pela sua filmografia. Ao vê-la, não restam dúvidas.

8ª SESSÃO - Belarmino

Realização: Fernando Lopes
Ano: 1964
Duração: 130 min.

Exibido a 6 de Dezembro de 2007


Convidado: Fernando Lopes
Debate conduzido por Maria Madalena Gonçalves
Tema do debate : NOS BASTIDORES DA REALIDADE


A sessão de hoje, dedicada ao visionamento de Belarmino, é uma sessão especial. Para além de irmos ver um filme documental que é um marco no nosso cinema, temos o privilégio e a honra de o podermos ver na companhia do seu realizador – Fernando Lopes – a quem desde já agradeço em nome dos estudantes da ESAD.CR, dos meus colegas, membros do PAR, e em meu próprio a forma espontânea e entusiasta com que aceitou de imediato o convite que lhe dirigi há algum tempo.

Fernando Lopes dispensa apresentações. Mas eu queria deixar, em especial aos estudantes de Cabo Verde aqui presentes e, em geral, a todos os estudantes mais jovens, duas brevíssimas palavras sobre o nosso convidado de hoje. Do seu longo e variado percurso, destacarei apenas o que se prende com as matérias que se ensinam na nossa Escola e com a sessão de hoje:

- Trabalhou na televisão no ano da sua inauguração (1957).
- Estudou em Inglaterra, na London Film School, entre 1959 e 1962.
- De regresso a Portugal, juntou-se à geração de realizadores que vinham da tradição cine-clubista: Paulo Rocha, António Pedro de Vasconcelos, João César Monteiro, entre outros.
- Em 1977 trabalhou com os melhores jornalistas da época (Joaquim Letria, José Júdice, António Mega Ferreira) no 2o Canal da RTP, que ajudou a criar.

Ao longo das várias décadas do recente século passado realizou inúmeros filmes e documentários. Como trabalho em documentário da década de 70, destaco:
- O Encoberto (1975) , dedicado à polémica estátua de D. Sebastião, em Lagos (da autoria de José Cutileiro); e Nacionalidade:Português (1972), por ser um trabalho infelizmente perdido, mas que foi feito em colaboração com o escritor Nuno Bragança.

E é aqui que eu quero chegar. Fernando Lopes realizou longas-metragens baseadas em romances de amigos e colegas seus que vêm do jornalismo, da reportagem e da literatura, quer dizer, da palavra escrita para ser lida. Ao lado do jornalismo e da reportagem, a literatura é uma referência central para a sua geração, que ele adapta ao cinema com grande rigor e sensibilidade.

Os títulos dos filmes mais emblemáticos falam desse encontro que se prolonga por várias décadas:
- Uma Abelha na Chuva (1971) é a adaptação do romance homónimo de Carlos de Oliveira;
- Crónica dos Bons Malandros (1983) é a adaptação do primeiro livro de Mário Zambujal;
- O Fio do Horizonte (1993) é a adaptação do romance do escritor italiano António Tabucchi;
- O Delfim (2002) é a adaptação do romance, com o mesmo título, de Cardoso Pires.

Nos trabalhos de maior fôlego, como estes, ou nos mais breves, Fernando Lopes deixa sempre a sua marca: qualidade e profissionalismo. Tornou-se, por isso, um dos mais prestigiados realizadores de cinema português. Sempre actual, vivo, presente o trabalho que hoje vamos ver pertence à geração de 60 – a do cinema novo português (coetânea da geração francesa da “nouvelle vague” e dos “Cahiers du Cinéma”) - mas Belarmino, sendo um filme de geração, não é um filme datado. Por isso o escolhi para integrar a programação deste Ciclo. É que ele é, simplesmente, o melhor documentário realizado em Portugal até hoje. Com mais de 40 anos (e uma ou outra cena à parte), é como se o tempo não tivesse passado por Belarmino. Jogo limpo, nenhum knock out. Belarmino é um marco, uma referência, um clássico.

Na ESAD.CR, sobretudo para quem nela estuda “som” e “imagem”, mas também “teatro” e “ fotografia”, é um exemplo a seguir por mais de uma razão. É, desde logo, um exemplo de como fazer bom cinema – do argumento à fotografia (assinada pelo grande Augusto Cabrita), da música aos efeitos sonoros, da escolha dos ‘actores’ ao texto que ‘dizem’. É, depois, um estudo magistral sobre coreografia dos gestos – quer humanos, quer físicos – estes, visíveis nos ângulos da câmara do realizador quando acompanha, com extremo rigor, o traçado da cidade, a arquitectura das fachadas, as ruas, as praças, os recantos, os cafés. É um estudo inédito, à época, sobre o ritmo da cidade e das pessoas dentro dela. É o melhor retrato social, psicológico, ideológico, cultural, político do Portugal cinzento dos anos 60 surpreendido num cidadão comum – Belarmino – e na narrativa que se constrói à sua volta: acima, de baixo, ao lado e dentro do discurso do próprio pugilista, daquilo que ele diz, da forma como o diz, e daquilo que não diz mas está lá. É uma lição sobre a montagem em cinema: ‘entre a palavra e a imagem’, para citar o tema do debate da sessão conduzida pela colega Susana Duarte quando, há dias, nos apresentou um documentário também excelente[i] no âmbito deste mesmo Ciclo. É, enfim, uma lição perfeita sobre a construção de narrativa em cinema-documental, sobre a construção de personagem em cinema-documental, sobre o enquadramento social da palavra em cinema-documental, em suma e rigorosamente, sobre a adaptação da palavra ao cinema em cinema-documental.
E, aqui, entra outra vez a literatura. Onde, dirão, se a palavra deste filme é a que circula entre um entrevistado (Belarmino) e um entrevistador (Baptista-Bastos)? Se é filme-documental? Através de um pequeno exemplo perceberão o que eu quero dizer: Baptista-Bastos refere, a dada altura, os golpes dolorosos que um pugilista recebe na “arcada supraciliar”. Belarmino comenta a observação de Baptista-Bastos referindo-se sempre a “arcádia supraciliar” – num achado digno do melhor Césariny, sem ter a consciência de, na forma errada de pronunciar a palavra, estar a evocar o planalto da Grécia que em poesia se tornou o símbolo da simplicidade pastoril. Este filme fala-nos, pela mão e pela sensibilidade estética e literária do seu realizador, também dessa simplicidade que nos anos 60 se confundia com analfabetismo, atraso e miséria.
Termino com a leitura do poema que Alexandre O’Neill dedicou a Belarmino um ano após a realização do filme, em 1965[ii]. Com este texto pretendo recordar outra das figuras gradas desta geração tão especial (a geração da década de todas as fermentações onde cinema, literatura, fotografia, imagem, música, arquitectura, vivência e consciência da urbe já dialogavam como hoje, mas de outra maneira) e, com as palavras de O’Neill, singelamente homenagear todos os belarminos de Lisboa - “homens vadios” - que foram os compagnons de route dos artistas-boémios desse tempo:

Amigos pensados: Belarmino

Tiveste jeito, como qualquer de nós,
e foste campeão, como qualquer de nós.

Que é a poesia mais que o boxe, não me dizes?
Também na poesia não se janta nada,
mas nem por isso somos infelizes.

Campeões com jeito
é nossa vocação, nosso trejeito.

Esperam de 1 a 10 que a gente, oxalá, não se levante
- e a gente levanta-se, pois pudera, sempre.

Mas do miudame levámos cada soco!
Achas que foi pouco?

Belarmino:
Quando ao tapete nos levar
A mofina,
Tu ficarás sem murro,
Eu ficarei sem rima,
Pugilista e poeta, campeões com jeito
E amadores da má vida.


Fernando Lopes, muito obrigada pelo seu Belarmino e por vir falar dele a uma plateia de jovens!

[i] Images of the World and Inscription of War, realizador Harun Farocki, 1988, Alemanha, 75 minutos. Passou na ESAD.CR no dia 26 de Novembro de 2007, às 18:30h, seguido de debate.
[ii] “Amigos Pensados: Belarmino” é um poema de Feira Cabisbaixa (1965). Consultar: O’Neill, A. (2000) Poesias Completas, Lisboa: Assírio & Alvim.

9ª SESSÃO - 2001: Odisseia no Espaço (et all.)

Realização: Stanley Kubrick
Ano: 1968
Duração: 141 min.


Exibido a 10 de Dezembro de 2007


Convidado: Sérgio Azevedo
Debate conduzido por Maria Madalena Gonçalves
Tema do debate : AS FORÇAS SIMBÓLICAS DA MÚSICA NO CINEMA


Estou particularmente feliz com o dia de hoje por ter sido possível concretizar o desejo de integrar neste Ciclo dedicado ao Cinema uma sessão onde se vai falar de música no cinema. Se nos lembrarmos que, nos seus primórdios, quando o cinema era mudo, os filmes se faziam acompanhar por um pianista que preenchia o silêncio com sons musicais, faz sentido ter uma sessão onde a música é tema de debate.

Mas estou feliz também e sobretudo por poder contar com Sérgio Azevedo nesta sessão. Ele deslocou-se expressamente à ESAD.CR para nos falar das “forças simbólicas da música” em excertos de vários filmes da sua escolha[i]. Sérgio Azevedo é um apaixonado por cinema e um entendido nesta matéria, além de ser um distinto compositor[ii], como se pode verificar na lista selectiva dos seus trabalhos impressa na folha em distribuição. Habituado a falar da relação entre cinema e música com os seus alunos na Escola Superior de Música de Lisboa, onde lecciona desde 1993, Sérgio Azevedo aceitou logo o meu convite e, por isso, lhe agradeço a disponibilidade tão gentilmente manifestada.

A sua presença entre nós oferece-nos a oportunidade de pensar com ele a relação música/cinema e, acima de tudo, a oportunidade de perceber melhor a importância da música na sua articulação com a imagem, tantas vezes injustamente ultrapassada pela força avassaladora e voraz desta que, em cinema, tende a levar tudo à sua frente. É importante que a nossa retina também oiça, e eu estou certa de que Sérgio Azevedo nos vai ajudar a preparar o salto para essa condição sinestésica - tão necessária à fruição mais completa do cinema enquanto 7a arte.

[i] Da lista que se segue, só houve tempo para visionar e comentar excertos dos filmes assinalados a negrito:
Kubrick: 2001, Odisseia no Espaço, 1968, GB, 141 min.
Kubrick: Eyes Wide Shut, 1999, US/UK, 152 min.
Kubrick: Paths of Glory, 1957, US, 86 min.
Kubrick: Barry Lyndon, 1975, GB, 187 min.
Kubrick: Laranja Mecânica, 1971, GB, 136 min.
H. Hook: Lord of the Flies, 1990, US, 90 min.
Cacoyannis: Zorba, o Grego, GR/US, 146 min.
Visconti: Morte em Veneza, 1971, IT,128 min.
Lynch: O Homem Elefante, 1980, US, 124 min.
Hitchcock: Vertigo, 1958, US, 128 min.
Hitchcock: Psico, 1960, US, 109 min.
Hitchcock: O homem que sabia demais, 1934, GB, 75 min.
Hitchcock: Os pássaros, 1963, US, 119 min.

[ii] OBRAS de Sérgio Azevedo (lista selectiva)
Monumentum pro Góra Kalwaria (4 clarinetes) 1992
Monodrama (cor de basset solo e 25 clarinetes) 1995
Coda (oboé solo, piano, viola, contrabaixo) 1997
Aspetto (quinteto de sopros) 1998
Atlas’s Journey (15 instrumentos) 1998
Keep Going (orquestra) 1998
Sequenza Prima (piano e quarteto de cordas) 2001
Sequenza Ultima (oboé solo e 10 instrumentos) 2001
Concertino (piano solo e 14 instrumentos) 2001
Concerto para Dois Pianos e Orquestra 2003
Sinfonietta Semplice (orquestra) 2004
Ariane dans son Labyrinthe (piano e quinteto de sopros) 2004
La Vera Storia d’Ulisse in Mare (orquestra) 2005
Berliner Trio (clarinete, piano, violoncelo) 2006
Concerto para Orquestra 2006
O Rouxinol do Imperador da China (ópera, vozes adultas e infantis, orquestra) 2007

10ª SESSÃO - Blow-up

Realização: Michelangelo Antonioni
Ano: 1966
Duração: 111 min.

Exibido a 13 de Dezembro de 2007



Debate conduzido por Luísa Soares de Oliveira
Tema do debate: CINEMA E REALIDADE


O debate desta sessão foi lançado entre os presentes a partir da referência ao texto de Julio Cortázar que inspirou o argumento do filme a Antonioni. Publicam-se aqui algumas passagens do conto do escritor argentino[1], que reflectem a temática enunciada no título:

[1] Excertos retirados de Julio Cortázar, Blow-up e outras histórias [s/d], Lisboa: Livros de Bolso Europa-América.

SESSÃO ABERTA DA ESCOLHA DOS ALUNOS - Good bye, Lenin!

11ª sessão - “Good Bye, Lenin!”

Realização: Wolfgang Becker
Ano: 2003
Duração: 118 min.

Exibido a 17 de Dezembro de 2007


Dentre uma lista de filmes propostos pelos alunos, foram seleccionados “para a final” Tuvalu, de Veit Helmer (1999) e Good bye, Lenin!, de Wolfgang Becker (2003). Por votação geral, foi escolhido o filme de W. Becker.

Nesta sessão não houve moderador. Os estudantes pediram que, desta vez, o debate decorresse sem tema fixo e sem ninguém a conduzi-lo para que as intervenções dos participantes pudessem ser feitas da forma mais livre possível, ao sabor do imprevisto e da espontaneidade.
Respeitando a vontade manifestada, os Cadernos PAR limitam-se a assinalar aqui o evento de maneira breve. O PAR aceitou, com agrado, a sugestão dos estudantes por ela corresponder inteiramente ao espírito da actividade, tanto no que diz respeito à liberdade de escolhas e independência de critérios, como à estreita e boa colaboração entre os estudantes e a equipa do PAR em matéria de acções culturais conjuntas.
Cabe talvez aqui uma nota referente ao êxito de todo o Ciclo, amplamente reconhecido pelos estudantes da ESAD.CR e demais participantes da Escola e público em geral. Todos os que tiveram oportunidade de assistir às sessões foram unânimes em reconhecer o interesse da iniciativa, pedindo “mais!”, já para o semestre seguinte.
Face ao êxito obtido, o PAR decidiu tornar este evento uma actividade regular da sua programação anual, pelo que o 1º semestre de cada ano lectivo será preenchido por um Ciclo de Cinema e Debate subordinado a um tema específico.

Podemos anunciar desde já o próximo Ciclo de Cinema e Debate na ESAD.CR, que será dedicado a 10 décadas de cinema - dos anos 10 a 2000. Fica assim a promessa do regresso e o apetite para “muito mais!”.

SESSÃO ABERTA À ESCOLHA DOS ALUNOS - Madagáscar

Madagáscar (animação, comédia), 2005.
Realização: Eric Darnell, Tom McGrath.
Argumento: Mark Burton, Billy Frolick, Eric Darnell, Tom McGrath.
Música: Hans Zimmer.
Produção: Dream Works Animation SKG/PDI .Co-produção: Theresa Cheng.

Moderador da sessão: Fernando Poeiras. Tema: “ver claro…”

“Uma comédia do pensamento”, M/6. Podia ser este o subtítulo, ou mesmo o título, de Madagáscar; se os seus criadores levassem “o” pensamento mais a sério. Felizmente isso não acontece. A tarefa de “intelectualizar” Madagáscar parece-nos divertidamente absurda, mas parece também que o humor não é irrisão suficiente para apresentar um filme neste contexto, ou para o comentar. Porquê esta escolha?
Só pensamos com o impulso de um afecto. Qual? Para a comédia o “amor” pelo conhecimento é apenas uma má farsa. A comédia estabelece uma relação, mais prática, entre o pensar e os jogos que inventamos para sobreviver. O órgão de pensamento privilegiado pelo humor, e também na vida quotidiana, é o bom senso. O bom senso adapta-nos ao útil, ao razoável, e a conviver com a “realidade” compartilhada. Do ponto de vista do bom senso, os jogos “cómicos” da sobrevivência são sobretudo “inadaptações”. Assim, há tantos motivos para rir quanto pessoas.
Algum pensamento acreditou conquistar a sua “pureza”, a sua “autonomia”, a sua “legalidade interna”, libertando-se do bom senso e do mundo, e daquela persistente “coisa” que se chama realidade. Pessoas deslocam-se a uma casa para aprender a pensar. Querem ser “profissionais” do pensamento: fechar os olhos e inventar “ideias”. Não as move nenhum “amor” à verdade. Há assuntos mais urgentes como os credores. Querem apenas fugir do mundo e adestrar uma das armas para sobreviver, a de que qualquer argumento serve. Na sua estratégia de fuga e de ataque, o pensamento “profissional” criou conflitos, que o obrigam novamente a fugir. Conflitos entre o “profissional” e o pensamento “mundano” (bom senso e senso comum), e entre a estupidez (a impotência de pensar) e o cinismo (a impotência oposta: conquistada a “liberdade” do pensamento o cinismo já não aguenta nenhum peso). Esta imagem do “pensamento”, e das suas personagens, é dada por Aristófanes nas “Nuvens”. Outra situação: as Nuvens estão baixas. Quatro animais, unidos numa amizade improvável, saem do seu “doméstico” zoo e iniciam uma hilariante viagem pelos “factos da vida”. As personagens movem-se num nevoeiro: os olhos estão abertos mas não se vê nada bem. (Acontece-me frequentemente.)
Apesar do bom senso ser (aparentemente) um órgão democraticamente distribuído, as comédias usam o bom senso de forma particular. O cómico existe na nossa vida mas a comédia precisa ser construída: 1º) Construção das peripécias. O tempo da comédia é o do infortúnio casual e não o do futuro previsível que o bom senso antecipa. A acção é a acção improvisada face às peripécias que o mundo vai generosamente fornecendo. (É preciso construir um ritmo divertido para a sucessão de desastres). 2º) Construção do lugar do espectador. Como o espectador é o fiel depositário do bom senso ele sabe mais, reconhece a situação (peripécia) em que foram lançadas as personagens sem saberem. Mas, nem sempre sabe mais do que as personagens: é preciso construir a montanha russa de sentimentos do espectador. 3º) Casting de caracteres que dramatizem conflitos interiores ao bom senso. Marty, Alex, Mellman e Gloria, um concentrado simpático da variedade de ilusões a desfazer pelo “real factual”: solipsismo, ideia fixa, confusão, ingenuidade, ignorância, alucinação, etc. Um acrobata da auto-ilusão (Juliano) debate-se com um peso-médio da sensatez (Maurício); ambos encabeçam uma comunidade histérica (governada pelo medo e pela esperança), e ainda um desnorteado pateta de peluche, sempre disponível para o papel de “sacrificável”. Um esquadrão de pinguins manipula a sua auto-apresentação (“sorrir e acenar”; o sonho de muitos nesta época em que o menor sinal de diferença real dá sempre lugar à reacção burgessa), e é o alto representante da “razão instrumental” (estratagemas e cálculos; o sonho de apenas alguns: espírito de missão contra a ordem do mundo). 4º) Não levar o bom senso demasiado a sério. O inimigo do pensamento quotidiano não é apenas externo (o “profissional”) é também interno: a sensatez quando se revela intolerável. A vitória das personagens sobre a realidade da sobrevivência, reconhecida como pura selvajaria, é um triunfo da liberdade de viver. Vitória sempre acompanhada pelo crescimento da alegria. 5º) Dar a tudo isto um aspecto variável e o ritmo delirante que esta animação permite construir.
O humor é um enigma: por um lado, é uma disposição para a agilidade lúdica necessária para pensar livremente; por outro lado, é sempre um acontecimento. Não há estratégia para o humor. Acontece: ou rimos, ou não rimos. Para terminar, uma palavra de alento aos mais sisudos, que - de facto - não viram Madagáscar. Há muitas maneiras de ter o olhar nebuloso: uma das mais divertidas, descobri agora, é estar à espera d’O pensamento. E ele nunca mais aparece, com a sua cátedra e óculos fundo de garrafa. Um pouco entediada com questões sobre O PENSAMENTO, Hannah Arendt, (que pensava por necessidade e desejo de real), atalha a conversa: “Não creio que possa haver seja que processo de pensamento for sem experiência. Todo o pensamento é re-pensamento: pensa depois da coisa. Não será assim?”

domingo, 20 de setembro de 2009

CADERNOS PAR Nº 2, 2007


PAR Nº2 - COLABORADORES

Célia Ferreira é licenciada em Ciências da Comunicação pela Universidade Nova de Lisboa (1992) e Mestre em História de Arte pela Universidade Lusíada (2001). É docente do ensino superior desde 1992. Lecciona Teoria da Comunicação, Comunicação Visual e Semiótica na ESAD.CR, para onde entrou em 1998. Actualmente, prepara o seu doutoramento em “Artes Visuais e Intermédia” na Universidade Politécnica de Valência.

Fernando Poeiras é licenciado em Ciências da Comunicação pela Universidade Nova de Lisboa (1993), onde prepara o seu doutoramento em Ciências da Comunicação em Cultura Contemporânea. Fez diversas formações/cursos na área do marketing, do design, das artes plásticas, da comunicação e da publicidade. É docente na ESAD.CR desde 2000, leccionando nos Cursos de Artes Plásticas e Design. Tem diversas publicações em revistas especializadas e de divulgação nas áreas da Comunicação, da Arte e do Design. Vários estudos seus nestas áreas foram tornados públicos através de conferências no Ar.Co, no CCB e na Gulbenkian.

Guilherme Mendonça é encenador, dramaturgo e actor, tendo iniciado a sua carreira ligada ao teatro no Curso de Actores do Instituto Franco-Português. Em 1997, estuda Stage Management na Guildhall School of Music and Drama, em Londres, cidade onde faz também um Master in Text and Performance Studies. Publicou poesia (Istmo), teatro (Tristes Trópicos) e tradução (O Espelho Atormentado). Fundou a companhia de teatro ‘Dramascópio’, ligada ao desenvolvimento e disseminação de processos de criação dramatúrgica, com actividades agendadas para 2009. Prepara o doutoramento na Brunel University (Londres) com uma tese em dramaturgia aplicada. Foi docente da ESAD.CR de 2004 a 2007.

João B. Serra é licenciado em História e recentemente nomeado Professor Coordenador da ESAD.CR (2008), onde lecciona as cadeiras de Património Cultural e Cidades Criativas. Pertenceu à 1ª Comissão Instaladora da ESAD.CR, em 1989/1991. É membro do Instituto de História Contemporânea da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, e membro da Comissão Organizadora para as Comemorações da Fundação da República. É autor de inúmeros estudos sobre temas de história política portuguesa do século XX e de história local e regional publicados em revistas, catálogos e diversas obras colectivas. Actualmente, prepara um livro sobre a vida e obra de José Relvas.

Margarida Tavares é licenciada em Teatro variante Formação de Actores pela Escola Superior de Teatro e Cinema de Lisboa. Tem uma pós-graduação em Texto Dramático Europeu pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto, e uma pós-graduação em Teatro e Educação pela Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Universidade do Algarve. Trabalhou durante dez anos na área de Expressão Dramática e iniciou a docência na ESAD.CR no ano lectivo de 2002/2003 nos cursos de ‘Animação Cultural’ e ‘Teatro’. Actualmente, prepara o seu doutoramento em Teoria, História e Prática do Teatro, na Universidade de Alcalá de Henares, com uma tese sobre “A voz no teatro em Portugal no séc. XX”.

Maria Madalena Gonçalves é licenciada em Filologia Românica pela Universidade de Lisboa e doutorada em Literatura Portuguesa Moderna e Contemporânea pela Universidade de Londres (King’s College, 1996). Foi assistente na Faculdade de Letras de Lisboa de 1974 a 1988, e leitora nos Departamentos de Língua e Cultura Portuguesa nas Universidades de Londres (de 1988 a 1996), Oxford (de 1996 a 2001) e Manchester (em 2001). Entrou na ESAD.CR em 2002. Actualmente, lecciona nos cursos de ‘Teatro’, ‘Som e Imagem’ e ‘Design Gráfico e Multimédia’. Tem diversas publicações (em livro e revistas) na área da narrativa, da poesia e do documentário.

Nuno Lisboa é licenciado em Ciências da Comunicação (1998) pela Universidade Nova de Lisboa. Na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da mesma Universidade prepara o doutoramento na área da sua licenciatura, com especialização em cinema. É bolseiro da Fundação para a Ciência e a Tecnologia. Tem trabalhos em realização. É programador do Seminário Internacional de Cinema Documental Doc's Kingdom desde 2006. Foi professor na ESAD.CR entre 2001 e 2006.

Paulo Martins é licenciado e mestre em História pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto e pela Universidade Nova de Lisboa, respectivamente. Prepara o seu doutoramento no Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE), sobre o cinema documentário e os filmes industriais em Portugal. Autor de vários romances, faz crítica cinematográfica temática sobre os filmes e o mundo empresarial/social, em publicações ligadas à Economia e Gestão, e sobre as artes em geral, na imprensa generalista. Na ESAD.CR, onde é professor no curso de ‘Som e Imagem’ desde 2005, lecciona as disciplinas de Guião e de Gestão e Produção Audiovisual e, mais recentemente, de Semiótica. É orientador de estágios na área do audiovisual.

Philip Cabau é licenciado em Arquitectura pela Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa (1987). É autor de diversos projectos e obras de arquitectura, cenografia, desenho de exposições e mobiliário. Leccionou no Ar.Co entre 1994 e 2001. Professor no Curso de Artes Plásticas da ESAD.CR desde 2000, coordenou o Departamento de Artes Plásticas e foi Subdirector entre 2004 e 2007. Actualmente, prepara um doutoramento sobre Dispositivos Pedagógicos do Desenho nas Artes Plásticas. É investigador do CRIA (FCSH/UNL e ISCTE). Apresentou diversas comunicações em Congressos , em Portugal e no estrangeiro.

Rodrigo Silva é licenciado em Filosofia pela Universidade Nova de Lisboa-Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (1998) com uma tese sobre o pensamento da história em Walter Benjamin, e doutorado em Comunicação e Cultura pela mesma Universidade (2007) com uma tese sobre O pensamento do “espaço” na filosofia contemporânea francesa. Docente na ESAD.CR desde 1998, lecciona actualmente as disciplinas de “Crítica e Teoria da Arte”, “Estudos de Cultura Contemporânea”, “Estudos de Estética” e “Escritos de Artistas”. Investigador no campo da Estética e da Filosofia Contemporânea, publicou artigos nestas áreas.

PAR Nº2, 2007 ----- Índice

íNDICE

Pragmáticas do Desenho em Design II
Fernando Poeiras

Pragmáticas de Desenho (também em design)
Philip Cabau

A matéria do património
João B. Serra

Os primórdios do cinema documental
Paulo Martins

O Cineasta e o Pintor
Nuno Lisboa

A pintura cénica de Manuel Amado em "o espectáculo vai começar"
Maria Madalena Gonçalves

Sobre a Fotografia de Fernando Lemos
Célia Ferreira

Uma teoria da prática em dramaturgia
Guilherme Mendonça

O pensamento da deslocalização
Rodrigo Silva

A distanciação Brechtiana e o trabalho do actor
Margarida Tavares

Ficha técnica:
Design gráfico e paginação - Sandra Francisco,
gabinete de Imagem e Comunicação do IPL
Relgráfica, 500 exemplares
ISSN - 1647-2063 ; Dep. Legal - 289653/09

CADERNOS PAR Nº1, 2006

Design gráfico - Luísa Barreto

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

PAR Nº1, 2006 ----- Índice

ÍNDICE

Treinar o olhar sobre as coisas do mundo: representação do acontecimento e da circunstância em O senhor Calvino de Gonçalo M. Tavares
Maria Madalena Gonçalves

Pensar o conceito de objecto
Isabel Gomes

O retrato em Lorenzo Lotto
Emídio Ferreira

Representação do irrepresentável
Nuno Lisboa

Pragmáticas do desenho em Design
Fernando Poeiras

Para além da representação, nos limites do visível
Rodrigo Silva

Sobre mimesis e teatro
Margarida Tavares
ficha técnica:
design gráfico - Luísa Barreto
paginação - Paulo Costa
Palma Gráfica, 1.000 exemplares