sexta-feira, 16 de outubro de 2009

3ª SESSÃO - Perigo na Noite

título original: Frenzy
Realização: Alfred Hitchcock
Ano: 1972
Duração: 118 min.

Exibido a 19 de Novembro de 2007


Debate conduzido por João B. Serra
Tema do debate : HITCHCOCK: HUMOR E MALDADE


Frenzy é o 55º filme de um cineasta que realizou, entre 1925 e 1976, nada menos que 56 filmes. Alfred Hitchcock nasceu em 1889 e morreu em 1980. Londrino, foi o autor do primeiro filme falado britânico. Em 1939, emigrou para os Estados Unidos, onde se consagrou como figura cimeira da indústria cinematográfica de Hollywood, criando a sua própria empresa produtora de filmes. No final da década de 50 e anos 60, depois de ter realizado Janela Indiscreta (1954), foi “descoberto” pelos críticos e cineastas da Nouvelle Vague francesa (Claude Chabrol, Eric Rohmer, François Truffaut), reforçando o seu prestígio na Europa. Alguns dos seus filmes antológicos são desse período: A Mulher que Viveu Duas Vezes (1958), Psico (1960), Os Pássaros (1963), Marnie (1964), Cortina Rasgada (1966).

Em 1970 voltou a Londres para rodar Frenzy. Poucos anos antes, Hitchcock tinha começado a trabalhar no argumento de um filme-documentário sobre um “serial killer” londrino que seduzia as mulheres antes de as matar, Neville Heath. O projecto deste fime cujo título seria Caleidoscópio incluía muitas cenas realistas, filmadas à mão, e a Universal rejeitou-o. Sucede que o primeiro título de Caleidoscópio fora precisamente Frenzy.

Frenzy tem por base os actos de um “serial killer” que viola as suas vítimas e as asfixia com a sua própria gravata. Covent Garden propiciou a Hitchcock as mais marcantes cenas de exterior de Frenzy. Como este mercado tradicional da cidade iria desaparecer pouco depois, podemos ver nesta escolha não só a homenagem que o realizador quis prestar a seu pai (vendedor de frutas e hortaliças em Covent Garden) como a transposição para este filme do intuito documental previsto para o filme recusado.
Hitchcock integrou esta produção não apenas no ambiente da cidade de Londres – com diversas referências aos seus emblemas urbanos – o Tamisa, a Tower Bridge, com as suas pontes basculantes – mas no sistema britânico de produção cinematográfica, recorrendo, por exemplo, a actores com experiência de palco mas não a estrelas do cinema.
O universo hitchcockiano é bem reconhecível neste penúltimo filme de uma longa carreira. Lá está, em doses específicas, uma história policial, a maldade humana, o humor carregado (humor negro), o jogo de sentimentos (o romance), o suspense. Mas está lá, sobretudo, um conjunto de procedimentos técnicos e artísticos que fizeram de Hitchcok um dos mestres da narrativa cinematográfica, e uma atenção aos pormenores que fazem dos seus filmes inesquecíveis momentos de mistério e divertimento.

Salientarei alguns desses procedimentos técnicos e alguns desses momentos inesquecíveis.
Quanto aos primeiros:
- a presença de Hitch no comício junto ao Tamisa.
- a violação e estrangulamento de Mrs. Blaney, num reduzidíssimo espaço de um escritório.
- a “descoberta” de Mrs Blaney pela secretária.
- o encontro entre Babs e Rusk, depois de ela sair do Pub.
- a despedida a Babs.
- a falta do alfinete de gravata.
- Rusk às voltas com o cadáver de Babs (140 takes).
- a sentença do tribunal.
- o desmarcaramento do “serial killer”.


Quanto aos segundos (em registo de humor negro):
- referências aos rins e fígado das vítimas do Estripador por um dos espectadores da recolha do primeiro cadáver.
- relação entre assassínios em série e turismo feitas pelos dois cavalheiros no pub.
- as referências às batatas e às uvas (“peal me the grape”, as uvas que acompanham a perdiz).
- um assassino que palita os dentes com um alfinete de gravata.
- as refeições confeccionadas por Mrs Oxford.
- a quebra de gressinos operada por Mrs Oxford enquanto ouve o relato do marido sobre a forma como o assassino retirou o alfinete da mão em “rigor mortis” da sua vítima.
- a teoria de que, apesar de tudo, o casamento defende melhor os indivíduos: os dois casais do filme (Oxford e Forsythe), embora não harmoniosos, não incorrem nos riscos das personagens não casados: um é preso por um crime que não cometeu, outro é um psicopata, duas são assassinadas e o espectador teme pela secretária de Mrs. Blaney.
- que pode esperar Blaney depois de reconhecido o verdadeiro culpado? um jantar de pato com espesso molho de cerejas preparado por Mrs Oxford…